quinta-feira, setembro 27, 2007

Retardo este encontro…

Olho-a daqui, de longe com o habitual sentimento dicotómico de amor-ódio.
Olha-a e desprezo-a, ao mesmo tempo que me atrai.
Evito-a e deixo-me levar pela sua languidez, como se pouco houvesse a fazer senão ceder-lhe e abraçar o seu feitiço, como se fugir-lhe fosse o último gesto, a última regra a quebrar.

Miro-a. Admiro-lhe a pose sólida, o calor, a calma.
Mas ao mesmo tempo odeio-lhe essa robustez e a inevitabilidade da lhe pertencer a cada noite.
Retardo os encontros, o toque.

Evito esfregar-me neste corpo que me adia cada hora.

A inevitabilidade deste momento que adio vence-me, no entanto.
Enrosco-me rendido neste corpo que escolhi para repousar e adormeço, enfim.
Até mais logo vida… todos temos que apagar a luz de quando em vez.
Para mais tarde retomar as batalhas que nos obrigam a voltar sempre a este leito.


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Huuummmm...

que sono caraças...
...

quarta-feira, setembro 26, 2007

Para sempre...














Abriram a porta da suite. Era espaçosa, como a vida que juraram juntos.
Miraram a decoração, espreitaram as vistas sobre o mar. As ondas, rebeldes, pareciam querer roubar a serenidade que o momento desejava.
Sobre a mesa, um cesto cheio de frutas, uns acepipes, uma garrafa de bom champanhe, do francês.
Olharam-se, sorrindo, de desejo. Algumas turbulências de tempos a tempos tinham sido esquecidas. Agora, apenas contava aquele momento eterno em que tudo era bom, tudo era belo.
Despiram-se e beijaram-se com promessas de amor eterno. Fizeram amor enquanto o mar, agitado, ruidoso, protestava contra a felicidade ali declarada.

Saiu de casa já noite dentro. Levava, apenas, uma pequena mala, com alguns pertences indispensáveis.
Deixava para trás uma bela casa, uma vida cheia de desejos e de sonhos. Não olhou para trás. Sabia que, apesar de agora vazia, aquela casa guardava segredos, angústias, sorrisos.
Mas nada disso tinha, agora, importância. Olhava o futuro através dos faróis do carro que lhe iluminavam as curvas da estrada. O mar, ali perto rugia, instigando a velocidade, empurrando-lhe mais ainda o desejo de partir.
A música como companhia, o cigarro como amparo.

Parou em frente à porta. Do cimo das escadas olhou para trás e desejou não ter adiado tantas vezes a partida.
Sentiu a turbulência do avião e um pequeno arrepio, habitual, interrompeu-lhe os pensamentos, os planos.
Lá em baixo, o ondular do oceano empurrava-lhe a mente para o destino, desconhecido mas desejado.
Para trás ficavam as noites mal dormidas, os desejos contidos, os planos frustrados.
Adormeceu sobre as nuvens, iluminado pelo sol que, sem obstáculos, lhe acariciava o rosto.



(Foto: Carlos C)

quinta-feira, setembro 20, 2007

O tempo tudo cura...


Podes dizer o tempo todo
Que amar é não ter medo
Que é não guardar segredos
Que é acautelar enredos.
Podes até escrever
Para eu não me esquecer
Para melhor entender,
Até me surpreender.


Mas deixa-me clarificar
O sentido dos temores
Que conservo e alimento.
Pouco justifica.
Inúteis amores
Sem desenlace feliz.
Esqueço o que não fiz
Supérfluo, não importa.



(Foto: Eduardo da Costa)

segunda-feira, setembro 17, 2007

Aos meus amores...














A pouco e pouco filtram-se as ilusões e as desilusões.
As histórias, produto de um estado de espírito mais ou menos inspirado ou inspirador, são desconstruídas por outras, novas, recentes, talvez ainda ilusórias, ou não... sei lá.
Se me fosse preocupar com isso não haviam amores nem desamores ou o que quer que fosse, nem parecido.

Aliás, nem sei porque carga d’água estou a falar no assunto. Talvez que necessite de ocupar o espaço em branco e à falta de melhor... siga...

Afinal o amor é o quê? Uma construção de mentes perturbadas que crêem ter um objecto de afecto? Como aquelas pessoas, também elas perturbadas, que acreditam ouvir e falar com espíritos?
O amor é desejo? Tesão por uns momentos bem passados – que se pode prolongar por mais ou menos no tempo – dependendo da paciência dos parceiros? Paciência, medo, ou até a agradável sensação de estima que se enriquece à medida que o tempo passa?
O amor é medo de solidão? Sim, que olhar em volta e ter que fazer o jantar para um, chá para um, servir um copo para um, para não falar do resto das rotinas, só para um, não é coisa fácil, previno.
O amor é o quê? Fogo que arde e tal... isso é coisa de poeta quinhentista.

Ó meus amores, afinal vós que fostes meu alimento, minha inspiração, minha vida, não passais de uma ilusória construção? Um engodo?

E tu,
que me libertas o mal,
me acalmas a dor,
me impeles,
me excitas,
me ensinas,
me pedes alegria,
conselho,
conforto,
me dás apenas
e tão só
um olhar sorridente
e cúmplice?

Ah, afinal, no final do dia, quando me sorris, és apenas fantasia.
É por isso que te desejo?
Porque afinal, mais não és que uma imagem, um sonho, virtual.
E afinal o que sinto é apenas o resultado de um qualquer poema, daqueles que te digo só para te fazer feliz.



(Foto: L. Gomes)

quinta-feira, setembro 13, 2007

quinta-feira, setembro 06, 2007

Da impotência...














Vergo-me à impotência e à inutilidade
Olho à volta e vejo o turbilhão,
Encontro-me com a multidão,
Massa uniforme, sem vontade.
Deito-me cansado
Dos olhares delatores,
Das mazelas, das dores,
De discretos brados.

Queria que os reis,
Imortais, enquanto grandes,
Me dessem das suas leis
Apenas a serenidade.
E, enquanto me escondo,
Imerso em águas cálidas
Apenas querendo, apenas supondo,
Aumentam as folhas caídas.

Chegou o dia
De acordar o alento,
De sacudir a apatia,
De conspirar com o vento.
Os fracos não têm história,
Nem favores, nem glória.
Sufocam devagar
O desejo de acordar.

(Foto: Armindo Dias)