quarta-feira, novembro 28, 2007

Nada só...

Não é a solidão ou a tristeza que me move. Não é sequer a ansiedade ou a alegria. É a paixão por estar vivo.
Estar vivo é apenas e só usar esta matéria de que sou feito para dar presentes, receber prendas, olhar em volta, mergulhar nos desafios, aceitar aventuras.

Deixa-me dizer-te que se ofereço lembranças é porque estive numa partícula do mundo que quero partilhar contigo.
Nem sempre como e quando queres, eu sei.
Mas, sabes? Às vezes interpõem-se outros valores, poucas vezes mais altos, é certo, mas urgentes.

Deixa-me brindar aos afectos, à amizade e ao desconhecido que nos aproxima.
Entende. Um dia desapareceremos e o que restará de nós será apenas aquilo que formos dando em cada momento.


Mas, como sabes, há quem insista em não querer entender.

“And in the end

the love you take
is equal to the love
you make”
(Lennon/McCartney – Beatles, Abbey Road)


(Foto: Ant)

sexta-feira, novembro 16, 2007

O gato e o rato...
















Apenas os olhos se vêem à saída da toca escura.
De garras bem afiadas, esperando a oportunidade de caçar...
A caça é adiada, sem prazo...

Quem é o caçador, quem é a presa?

De gatos e ratos são feitas as seduções, os breves instantes, as histórias.

O isco ali fica, incerto do seu interesse...



(Foto: Alberto Viana)

segunda-feira, novembro 12, 2007

Doces segredos...

O fácil
Revela-se complexo.
A tranquilidade esvai-se
O medo
O couto, seguro,
É dormência, representação
Da inocência.















Acordar,
Esfregar os olhos
Abrir a janela,
Mergulhar na água morna,
Deixar arrefecer,
Gelar, gelar, gelar
Até esquecer a dor.




Deixa-te ficar nessa manta quentinha, meu filho.
Aninha-te nessa cálida esperança de que um dia serás homem feito e hás-de entender os desígnios da vida.



Um dia os segredos desvelar-se-ão e tu serás um de nós.



Daqueles que, longe dos doces berços maternais, disputam a glória de estar vivo.


(Fotos: Paulo César, Google... Mariah)

quarta-feira, novembro 07, 2007

Onde estás...














Apesar do tempo, apesar da distância, não esqueço o perfume da tua pele, o sorriso dos teus lábios.
Longe, tão longe...
A memória não desiste
Insiste... insiste...

O amor é eterno, por muitos amores que se sucedam, por outras paixões que se acendam, permanece o resíduo do desejo de possuir esse ardor que, de tão doce, se não esquece o sabor.

Eternas as recordações, doces.
Estupendas as memórias dos beijos com sabor a brisa do rio e dos risos dos marinheiros invejosos da nossa felicidade, embora fátua.

Meu amor, meu amor, onde estás que te não vejo?
Meu amor, meu amor, porque não te esqueço, agora que nada nos prende?

Sou um viajante, por entre os baús das tuas palavras... sim das palavras que sempre me disseste, sim dos abraços que sempre me deste.


(Foto: ... da net...)

sexta-feira, novembro 02, 2007

Saudade...

“Quem mostra' bo ess caminho longe? Quem mostra' bo ess caminho longe? (...)
Sodade sodade sodade...”
Cesária Évora
















Tinham-se encontraram-se em Paris, algures perto de Notre Dame. Ele cumpria um sonho antigo, ela aproveitava o sol de Outono para se espraiar longe do trabalho.

Conheciam-se de sempre, do tempo em que a escola era castigo. Tinham vivido lado a lado, ela de sainhas e soquetes, ele de calçonitos e sandálias, até aos primeiros prazeres da juventude, da liberdade conquistada a pulso. A amizade sempre mais que tudo, mais que desejo... mais que tudo.

Ela tinha partido cedo, para longe, para o centro do mundo, onde tudo se passava. A ternura, essa, alimentavam-na por cartas. Os casamentos, os filhos, os divórcios. E ela viajando, sempre, buscando conhecimento. E ele buscando-se nas partituras do piano, na espiral de sucessos imberbes, ficando, ficando...

Mas ali, em Paris, a solidão dela aninhou-se na alegria de sonho cumprido, dele. Percorreram a cidade, cada recanto, cada sabor, cada miragem.
E foi na miragem, de improviso, que se deleitaram se deixaram possuir pelos desejos.

Na hora da partida, a promessa de nunca se perder a ternura.
Pela janela do avião, ele procurava-a.
Imaginava-a percorrendo a cidade ainda em busca de uma paz que demorava e que tinha aprendido a esquecer. Domando a saudade e a solidão.
Deixou-se repousar enquanto pensava no regresso, inevitável.
Lá, a solidão também existia. Mas era tolerada pelo sol de todos os sorrisos que colhia nos rostos e nas palavras, que só os afectos sólidos podem oferecer.


(Foto: Rosalina Afonso)